quarta-feira, 8 de julho de 2009

"... Você achou mil acres um exagero? Achou a terra um exagero?
Praticou bastante até aprender a ler?
Sentiu orgulho de entender o sentido dos poemas?

Fique este dia e esta noite comigo e você vai possuir a origem de todos os poemas,
vai possuir o que há de bom da terra e do sol... sobraram milhões de sóis,
nada de pegar coisas de segunda ou de terceira mão... nem de ver através dos olhos dos mortos... nem de se alimentar dos espectros dos livros,
e nada de olhar através dos meus olhos, nem de pegar coisas de mim,
você vai escutar todos os lados e filtrá-los a partir de seu eu.

Ouvi o que os falastrões falavam... a fala do começo e do fim,
mas não estou falando nem de fim nem de começo.

Nunca existiu mais princípio do que este agora,
nem mais juventude nem velhice do que esta agora;
nem vai existir mais perfeição do que já existe agora,
nem mais céu ou inferno do que existe agora."
(Walt Whitman)

Para Marlon Macarini

quinta-feira, 2 de julho de 2009

(...) Creio que é Cícero quem diz que, ao penetrar num bosque alto e cerrado, a presença de uma deidade se manifesta a você. Há bosques sagrados por toda parte. Lembro-me de ter ido a uma floresta, quando menino, e ficar reverenciando uma árvore, uma enorme e velha árvore, enquanto pensava: "Ah, o que você conheceu, o que você tem sido!" Acho que essa sensação da presença da criação é uma tendência básica do homem. Mas hoje vivemos em cidades. É tudo pedra e rocha, manipuladas por mãos humanas. Você vive outro tipo de realidade quando cresce lá fora, no meio da floresta, ao lado dos pequenos esquilos e das grandes corujas. Todas essas coisas estão ao seu redor como presenças, representam forças, poderes e possibilidades mágicas da vida, que, embora não sejam suas, fazem parte da vida e lhe franqueiam o caminho da vida. Então você descobre tudo isso ecoando em você, porque você é natureza. Quando um índio Sioux apanha o cachimbo da paz, ele o empunha com o bocal apontando para o céu, para que o sol dê a primeira baforada. Em seguida ele o apontará nas quatro direções, sempre. Com a mente assim constituída, quando se dirige ao horizonte, ao mundo onde você está, você percebe que ocupa o seu lugar no mundo. É uma maneira diferente de viver.

JOSEPH CAMPBELL - "O PODER DO MITO"

CANÇÃO DA ESTRADA ABERTA (FRAGMENTOS)

A pé e com o coração iluminado, adentro a estrada aberta,
saudável, livre, o mundo adiante de mim,
a longa senda marrom em minha frente, conduzindo-me para onde quer que eu escolha.

A partir de agora não peço mais pela boa sorte, pois eu mesmo sou a boa sorte,
A partir de agora abandono as lamúrias, não mais procrastino, de nada mais necessito,
estou farto de reclamações entre quatro paredes, bibliotecas, críticas conflituosas,

Forte e satisfeito eu viajo pela estrada aberta.

A Terra, ela é suficiente para mim,
não desejo as constelações mais próximas,
sei que estão muito bem no lugar onde estão,
sei que são suficientes para aqueles que vivem por lá.

(Ainda assim, por aqui eu carrego meus velhos fardos deliciosos,
carrego-os, homens e mulheres, carrego-os onde quer que eu vá,
juro que é impossível me livrar deles,
estou realizado por eles, e hei de realizá-los em troca)

WALT WHITMAN
Nas tardes de verão, irei pelos vergéis,
picado pelo trigo, a pisar a erva miúda:
sonhador, sentirei um frescor sob os pés
e o vento há de banhar-me a cabeça desnuda.

Calado seguirei, não pensarei em nada:
Mas infinito amor dentro do peito abrigo,
e como um boêmio irei, bem longe pela estrada,
feliz - qual se levasse uma mulher comigo.

RIMBAUD - "SENSAÇÃO" - Março de 1870.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

"(...) Eu não desejaria ver cada homem cultivado, nem cada parte de um homem cultivada,assim como não veria cada acre de terra cultivado: parte será lavoura, mas a maior parte será prado e floresta, não só atendendo a um uso imediato, mas preparando um húmus contra um futuro distante pela decomposição anual da vegetação que o suporta".

(...)Ouvimos falar de uma Sociedade pela Difusão do Conhecimento Útil. Afirma-se que conhecimento é poder, e coisas do gênero. Eu acho que existe uma igula necessidade de uma Sociedade pela Difusão da Ignorância Útil, o que chamaremos de belo conhecimento, um conhecimento útil num sentido mais elevado: pois o que é a maior parte do nosso tão vangloriado conhecimento, assim chamado, senão uma presunção de que sabemos algo, que nos rouba da vantagem de nossa ignorância de fato? Através de longos anos de paciente aplicação e leituras dos jornais - pois o que são as bibliotecas de ciência senão arquivos de jornais? - um homem acumula uma miríade de fatos, deposita-os na sua memória e então, quando em alguma primavera da sua vida se aventura a passear pelos grandes campos do pensamento, é como se fosse ao pasto com um cavalo e deixasse todos os seus arreios para trás no estábulo. Eu diria que a Sociedade pelo Conhecimento útil, às vezes, vai ao pasto. Vocês já comeram muito feno. A primavera chegou com sua safra verde."

THOREAU - CAMINHANDO
"Resisto a tudo menos minha própria diversidade,
respiro o ar e deixo muito mais ar atrás de mim,
não sou pretencioso, estou no meu lugar.

(...)Esta é a relva que grassa onde quer que haja terra e água,
este é o ar comum que banha o globo.

Este é o hálito das leis, canções, comportamento,
esta é a água insípida das almas.... este é o verdadeiro alimento,
é pros iletrados... pros juízes da suprema corte... pra capital federal e o estado do capitólio,
pra comunidade admirável dos literatos e compositores e cantores e oradores e engenheiros e sábios,
é para as raças infinitas de trabalhadores, agricultores, marinheiros.

Isto é o trinar de mil trompetes nítidos e o grito da oitava flauta e o ataque dos triângulos,
não toco marchas só pros vencedores.... também toco pros mortos e vencidos com o mesmo espírito.

Já ouviu alguém dizer que foi bom ganhar o dia?
Pois digo que também é bom cair.... batalhas são vencidas com o mesmo espirito com que são vencidas.

(...) não sei dizer como se dobram meus tornozelos.... nem a razão do meu mínimo desejo,
nem o porquê da amizade que emito.... nem o porquê da amizade que retomo.

WALT WHITMAN - CANÇÃO DE MIM MESMO (FRAGMENTOS)
"Os mensageiros animais, enviados pelo Poder Invisível, já não servem mais, como nos tempos primevos, para ensinar e guiar a humanidade. Ursos, leões, elefantes, cabritos e gazelas estão nas jaulas dos nossos zoológicos. O homem não é mais o recém-chegado a um mundo de planícies e florestas inexploradas, e nossos vizinhos mais próximos não são as bestas selvagens, mas outros seres humanos, lutando por bens e espaço, num planeta que gira sem cessar ao redor da bola de fogo de uma estrela. Nem em corpo nem em alma habitamos o mundo daquelas raças caçadoras do milênio paleolítico, a cujas vidas e caminhos de vida, no entanto, devemos a própria forma dos nossos corpos e a estrutura das nossas mentes. Lembranças de suas mensagens animais devem estar adormecidas, de algum modo, em nós, pois ameaçam despertar e se agitam quando nos aventuramos em regiões inexploradas. Elas despertam com o terror do trovão. E voltam a despertar, com uma sensação de reconhecimento, quando entramos numa daquelas grandes cavernas pintadas. Qualquer que tenha sido a escuridão interior em que os xamãs daquelas cavernas mergulharam, em seus transes, algo semelhante deve estar adormecido em nós, e nos visita à noite, no sono.

JOSEPH CAMPBELL - O CAMINHO DOS PODERES ANIMAIS